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TESTEMUNHOS DO SILÊNCIO

  • Paulo L. Menezes
  • 24 de ago. de 2015
  • 6 min de leitura

“As pessoas só se tornarão mais razoáveis se perderem o medo que têm umas das outras e de si mesmas.”

MICHEL DE NOSTREDAME

(mais conhecido pelo nome latino, NOSTRADAMUS)

Distraio-me com a dança dos fantasmas, não estou preparado para o que preciso, nem para o que quero ver... (fragmento de livro a ser publicado)

−A auto-imposição do silêncio é à base da grandeza humana −, pensou.

Foi numa noite sem sono e sem sonhos. Noite de divagações.

Ouvia uma voz que não estava ali. Ouvia uma voz, mas não com os ouvidos. A voz de uma criança sem olhos que falava sem mover os lábios, capaz de enxergar além das fronteiras do mundo tangível:

−Meu dom é talento e maldição, enxergar o mundo como realmente é, vislumbrar o que as pessoas tentam esconder de si mesmas.

Falava de tesouros perdidos e demônios ocultos; supunha que renasceriam heróis, cujas forças entrariam em sinergia para encontrar os tesouros e destruir os demônios.

Seu corpo revelava o que a mente tenta esconder e perguntou, com a força do pensamento:

−Como inúmeros talentos serão capazes de trabalhar em conjunto, rumo a um objetivo em comum?

A razão da menina deusa retumba em seu cérebro conturbado:

−Falhas e fraquezas são as chaves da conquista. A chave da derrota é a arrogância dos que não entendem o conceito de auto-sacrifício. Nosso estratagema secreto: segui-los no tempo, até a sua origem, destruir o mal pela raiz.

Não aceitou mais ser apenas um número:

− Vivo e morro como nasci, um homem livre.

Tentaram castrar seus sonhos.

Tiranos pisaram em seus planos, ele os refez; logo após, presenciou os seus amigos e a sua família se desfazendo em pó e fumaça.

Ficou vazio. O tormento consumiu o que restavam de suas forças.

Implorou para morrer junto com aqueles a quem amava. Não foi atendido.

Alimentou as frágeis esperanças com débil força de vontade.

Chegara à hora da vingança.

Conhecia seus nomes e rostos detalhadamente. Sabia de suas ousadias.

Por ingenuidade, acreditara que seriam seus amigos. Quando caiu em si, já era tarde, tinham apenas duas opções: lutar e morrer ou viver como escravos. Sombras do que eram.

Estavam em guerra. Na guerra não existem pausas ou amizades.

Eles não conheciam a piedade no início, não teria misericórdia no fim.

Seguiu os seus objetivos, estabelecidos por memórias que sempre o assombravam:

−Queriam arrancar nossas almas e os nossos corações. Conspurcaram nosso mundo com suas pestes e sujeiras. Destruíram nosso modo de vida. Impuseram-nos suas crenças e nos ensinaram a adorar seus deuses moribundos.

Precisavam de liderança. Alguém imbatível e sedento em vingar-se. Jamais imaginou que seria o escolhido, agora, o peso da responsabilidade recaía sobre os seus ombros.

Tantos cadáveres, e não havia tempo para chorar ou sepultar aos mortos.

Gritou, até perder a voz.

Sentiu sua coragem desfazendo-se junto com a alma.

Reagrupou os que restavam, e juntos juraram vingarem-se.

− Assim será: eles pagarão por tudo!

As lágrimas secaram. Os espíritos da terra recolheram-se em suas profundezas. Os temores foram erradicados. As fraquezas não mais existiam. Libertaram seus demônios e lhes entregaram a lança do desespero, o arco da fúria e a flecha da vingança.

−Conheço bem nossos adversários, e os nomeei como inimigos. – explicava − Usaremos todos os recursos ao nosso favor: os pássaros no céu são nossos aliados. A chuva que cai é nossa Irmã. O vento que sopra é nosso cúmplice. As árvores e cavernas são nossos refúgios.

Os invasores pensavam que estivessem vencidos. Ressurgiram como uma força da natureza.

Placidamente, observaram os oponentes caindo, um após o outro.

O que acontece depois?

Eles não param de chegar. Trazem ódio nos olhos e violência nas mãos. São os donos da nova ordem e não sabem partilhar, só possuir, vender, comprar...

−Tenho uma certeza na alma, (expôs ao povo) sei o que devo fazer. É uma sensação que já tive antes. Existem atitudes que explicam ações, mas parece que não as justificam. Somos todos responsáveis por nossos atos. O retrospecto da derrota não é lá grande coisa. Não devemos prescindir da estratégia.

Sem aviso, surge tanta coisa na vida que o faz pensar se esse realmente é o seu lugar.

−Quem sabe sou um covarde? – indaga-se na solidão.

Cogitava: “Correr para sobreviver não é uma experiência nova”.

−Juntos nós faremos a diferença! − declarava aos valentes guerreiros, irmãos e companheiros de inúmeros combates.

As pessoas ouvem o que querem e tendem a acreditar no que ouvem:

−Estamos na encruzilhada dos deuses, − dizem os anciões − o que for decidido agora afetará as gerações futuras.

Que todos morrem é uma certeza. Só queria ter o privilégio de saber por que morreria.

−Morrerei tentando elaborar um mundo melhor! – discursava − Salvemos nosso mundo! Não deixemos o mundo morrer!

Procurou os chefes adversários. Tentou negociar a paz. Não entendia porque falavam uma coisa e faziam outra. Compreendeu que não tinham honra.

−Será que vou chorar quando novamente me apunhalarem sorrindo, com a lâmina da traição? “Oferecerei a outra face” ou revidarei? – perguntava-se desconfiado, lembrando os homens santos do inimigo, que ensinavam sobre um deus ensangüentado.

Depois julgou ter alcançado entendimento:

−Uma vida que não se sacrifica por um bem maior é uma vida nula e insignificante. Todos já tiveram que fazer coisas terríveis sobre as quais não tinham controle. Aquele que esquece o passado está condenado a repeti-lo.

Reuniu novamente os bravos. Não usou a ira, preferiu bons sentimentos:

−Não posso me entregar ao fantasma da dúvida, meus irmãos. Há mistérios nestas terras, tão antigos quanto elas mesmas. Tiraram-nos a prata, o ouro e tudo que julgavam preciosos, mas não quebraram nossos espíritos, esse foi o seu maior erro.

Relembraram e repetiram os cânticos ancestrais. Outra vez ouviram o riso das crianças. Pela última vez, fizeram amor com suas mulheres.

A natureza, gentilmente, lhes ofereceu as suas cores. Mãos femininas pintaram seus corpos para a derradeira batalha.

−Quem foi que decidiu a nossa história? Onde foi que nós erramos? Terão os deuses antigos nos abandonado? Estão dispostos a correrem comigo, rumo aos nossos destinos?

A resposta foi um temível grito de guerra que transpôs aos campos das ferozes batalhas.

O corpo pesa, e há fogo nos pulmões.

Tenta concentrar-se, talvez seja tarde demais para isso. Sempre é tarde demais. Seu sangue escorre, aos borbotões, e mescla-se com o sangue dos inimigos e ao de seus correligionários.

Quase ao mesmo tempo, em todas as Américas, milhares têm o mesmo fim.

Finalmente adormecem o profundo sono dos justos e dos corajosos.

−Minha missão está cumprida. Deixem-me dormir em paz!

×××××××××××××××××××××××××××××××××××××××

Acorda em outra época. Não sabe quanto tempo dormiu. A visão está turva. O cérebro reage devagar, diante a um enigma que não consegue resolver. Às vezes tem momentos de clareza. Tenta usar o que funciona.

Os opressores estão morrendo de medo. Chega a ser cômico. São profissionais da matança, mas não sabem salvar a própria vida. Deviam reagir e resistir, entretanto são vencidos com facilidade pelos seus próprios erros e fracassos.

Falta-lhes confiança, eles não agem mais como equipe. Quando não havia mais inocentes para matarem, mataram-se uns aos outros. TORNARAM-SE ESCRAVOS DO PRÓPRIO MEDO. Pensa em aproveitar-se disso. Só então entende o que realmente aconteceu: o fedor nauseabundo, da mais ínfima maldade, transformou o planeta num enorme esgoto, radioativo, a céu aberto.

GUERRAS! E eles as enumeram. Quando uma acaba, prevêem a próxima.

Fervilham ideologias, e todas estão ultrapassadas por elas mesmas.

Suas crianças estão perdidas e sem referências. Entre o abuso de drogas, o consumismo desenfreado, a infinidade de moléstias e a velocidade dos acontecimentos, perdem a noção dos fatos.

O fato é que estão desesperados.

O ar torna-se venenoso e as imensidões geladas derretem. Florestas imensas foram sendo transformadas em desertos. A grande mãe natureza derrama suas lágrimas em tormentosas chuvas, na esperança de limpar o ar. Rios, oceanos e mares reclamam os seus espaços. A mãe terra treme, será de pavor?

Seus corpos clamam por descanso. Suas mentes reclamam oras merecidas de sono...

Sem chance! É aqui que a história começa a valer à pena.

−Acorda meu povo!!!  é o seu apelo  Havia um tempo em que tudo o que eu não pudesse prever me entediava. Eu era jovem e me chamavam selvagem. Tinha cabelos soltos ao vento e detestava fazer suposições. Queria saber com antecedência de que forma os capítulos de minha vida começariam e qual seria o clímax dos acontecimentos. Talvez seja a idade, quem sabe o fato de ter presenciado muita coisa? Aprendi a ter paciência e a esperar pelos acontecimentos.

Aquilo que ele não via antes terminou aprendendo do mesmo jeito: todo jogo é o mesmo jogo.

Uma realidade nova e fria se apresenta: não pode haver vencedores nesse jogo, a única certeza é que todos perdem. Os modelos mais apavorantes estão se apresentando como os mais realistas.

Hoje, aprecia detalhes e busca soluções para males antigos.

Rememora a pergunta que fez a deusa: “Como inúmeros talentos serão capazes de trabalhar em conjunto, rumo a um objetivo em comum?”

Em profunda concentração, recebe extasiado o testemunho do grande PERÍODO DE SILÊNCIO:

− Nós somos a coletividade, guerreiros de todas as raças, heróis de todas as crenças, opções e orientações sexuais... E culturas. Herdeiros de todas as épocas. Vindos de todos os lugares, conquistamos o centro do mundo e nos conectamos a todas as correntes do bem. Invadimos todas as realidades, numa última tentativa de salvar o mundo, depor os tiranos, viver com fartura e morrer em PAZ!

( Chakaruna )

 
 
 

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